Falar sobre o cheiro do corpo do outro pode ser um dos maiores desafios dentro da intimidade — especialmente quando envolve o pênis e a relação com o homem cis e hétero. Para muitas mulheres, esse incômodo vira um peso silencioso. Elas seguem se relacionando, mesmo desconectadas, mesmo atravessadas por um desconforto que não sabem como comunicar sem causar dor. Mas o que está em jogo aqui não é só o cheiro. É o quanto aprendemos a engolir o que sentimos, com medo de ferir o outro. E o quanto ainda é difícil para o homem escutar sobre si mesmo sem se sentir atacado.
A verdade é que muitos homens cresceram presos a um modelo de masculinidade que os ensina a medir seu valor pela performance. A relação com o próprio corpo — e especialmente com o pênis — se constrói sobre um ideal de força, potência e domínio. Quando uma mulher traz uma fala que toca nesse lugar, mesmo que com todo o carinho do mundo, o homem pode sentir que está sendo desautorizado, diminuído, invalidado. E reage com negação, raiva ou fechamento — não porque é fraco, mas porque não aprendeu a acolher suas próprias fragilidades.
É por isso que, para além do corpo físico, o que precisa ser curado é o vínculo com o sentir. Um homem que não consegue escutar o que a parceira sente, também não consegue escutar o próprio corpo. Ele está tão ocupado tentando “dar conta” que esquece de respirar, de estar presente, de perceber. E o sexo vira uma tentativa de provar algo — quando, na verdade, deveria ser um espaço de entrega, não de esforço. De conexão, não de cobrança.
Quando a mulher escolhe se expressar com presença, sem acusação, ela não está criticando. Está convidando. Um convite que diz: “Eu quero me conectar mais. Mas pra isso, preciso que a gente cuide disso juntos.” Um simples gesto como propor um banho a dois, criar um ritual de preparação antes do sexo, ou até dizer com afeto que o cheiro está desconfortável e que para ela é importante que ele tome um banho antes da relação, pode abrir portas de escuta e cuidado. Desde que venha do coração com cuidado com as palavras e o tom da voz — e não do acúmulo de frustrações.
É importante lembrar que as palavras têm corpo. Elas tocam, elas provocam, elas ensinam. Dizer “você tá fedendo” fecha qualquer escuta. Mas dizer “quero que a gente se cuide juntos, pra que nosso encontro seja ainda mais gostoso” abre espaço para o outro entrar, sem precisar se defender. A linguagem do afeto é uma linguagem de construção, não de correção. Ela mostra que é possível falar de tudo — inclusive das partes difíceis — com maturidade emocional.
E mesmo quando ainda não há intimidade suficiente para uma conversa direta, o corpo também pode guiar. Convidar pro banho juntos, trazer leveza e erotismo para o cuidado, pode ser uma forma sutil e eficaz de criar um ambiente mais agradável sem gerar tensão. Isso não é manipular, é saber conduzir com presença. É transformar o que poderia virar um atrito em um gesto de carinho e desejo.
A sexualidade consciente nasce justamente desse espaço onde a verdade pode ser dita sem medo. Onde os corpos não precisam se suportar em silêncio, mas podem se comunicar com liberdade. Porque não existe prazer real sem escuta. E não existe conexão profunda onde um precisa se anular para que o outro não se sinta ofendido. Relacionamento é lugar de expansão — e não de tolerância silenciosa.
Por isso, se existe algo no corpo do outro que te afasta, o caminho não é o silêncio amargo, nem a crítica impiedosa. O caminho é o afeto corajoso. A conversa que começa com “eu quero estar com você” e não com “você está errado”. Porque quando há amor, o cuidado não corrige — ele convida. E quando há maturidade, o outro entende que esse convite não o diminui, mas o liberta. Afinal, ninguém quer ser suportado. Todos queremos ser sentidos, desejados, escolhidos — com corpo, cheiro e verdade.